quinta-feira, 17 de março de 2011

realidade

Deito fora as imagens.
Sem ti, de que me servem
As imagens?

Preciso habituar-me
A substituir-te
Pelo vento,
Que está em qualquer parte
E cuja direcção é igualmente passageira
E verídica.

Preciso habituar-me ao eco dos teus passos
Numa casa deserta,
Ao trémulo vigor de todos os teus gestos
Invisíveis,
À canção que tu cantas e que mais ninguém ouve
A não ser eu.

Serei feliz sem as imagens.
As imagens não dão felicidade a ninguém.

Era mais difícil perder-te,
E, no entanto, perdi-te.

Era mais difícil inventar-te,
E eu te inventei.

Posso passar sem as imagens
Assim como posso
Passar sem ti.

E hei-de ser feliz ainda que
Isso não seja ser feliz


Coração sem imagens - Raul de Carvalho

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